CALENDÁRIO DE EVENTOS-FEIRA DO FUMEIRO

A ENTREVISTA
 

 

Para muitos foi um visionário. O atual presidente da Câmara de Montalegre é considerado o "pai" da Feira do Fumeiro. Uma "galinha de ovos de ouro" que colocou Montalegre, há um quarto de século, no mapa da procura e da atração turística. Orlando Alves lembra como tudo começou. Um caminho iniciado com pedras mas que cedo conquistou o tapete das luzes. Entre tantas curiosidades, fica a confissão que a "rainha do fumeiro" foi oferecida à oposição e que esta não a quis. Chegado ao poder, o autarca só teve que agarrar a ideia e fazer nascer o maior evento algum dia idealizado no concelho.

 

Gabinete de Imprensa (GI) - Como apareceu a Feira do Fumeiro em Montalegre?

Presidente - Fui durante dois ou três mandatos vereador da oposição. Na altura fazia-se aqui a AGRO BARROSO. Era uma manifestação da nossa força, do nosso barrosismo mas era, sobretudo, uma exposição de tratores e pouco mais. Já nessa altura eu sentia que se podia caminhar no sentido de vincar a matriz rural e cultural das terras de Barroso. Nesse sentido, e estando na oposição, dei esta ideia para que se fizesse uma grande realização à volta do presunto e do fumeiro. Nessa altura, a ideia não foi aceite. Quando cheguei à Câmara, em articulação com o restante executivo, o Dr. Pires e o professor Fernando, entendemos avançar. Preparámo-la com um ano de antecedência. Andamos pelas aldeias.... nós, o padre Fontes, a Dr.ª Irene, o João Ribeiro, para sensibilizarmos as pessoas a produzirem mais um animal do que era uso lá em casa e que o direcionassem para algo que a Câmara estava a preparar e de que iriam gostar. Foi assim que conseguimos que participassem pouco mais que uma dúzia de produtores. Devo dizer que acreditaram com alguma desconfiança. A primeira edição aconteceu em 1991 numa das garagens da Zona Agrária. Desde aí tem vindo sempre a crescer e agora é esta grande realização que faz inveja a muita gente. Temos que saber manter-lhe o nível.

 

GI - É sabido pela memória, que o agricultor barrosão era avesso a vender o que a casa produzia. O que lhe foi dito quando foi desafiado a vender?

Presidente - Olhe...as pessoas riam-se da proposta. Não acreditavam nela mas assumiram um compromisso. Ao jeito barrosão, que dá a palavra e vale como uma escritura, quem se comprometeu connosco não falhou. Ao longo do ano fomos fazendo um acompanhamento. Também soubemos estar presentes na hora da matança para relembrá-los do nosso intuito. Tinha que haver uma grande relação de confiança da nossa parte. Os barrosões estavam habituados a produzir para consumo próprio e viam até com desdém e pouco gratificante, vender o que a casa dá. Conseguimos vencer todas essas lutas e acabamos por ser bem-sucedidos.

 

GI - Colocada no terreno, que impressão começou a ter dos primeiros visitantes da Feira do Fumeiro? Ficou logo com a ideia de que era um filão com margem de crescimento?

Presidente - Fiquei logo convencido disso. No segundo dia, da primeira realização, já não havia fumeiro. Já nessa altura tínhamos feito uma grande campanha de publicitação do evento. No terceiro dia, tivemos que nos mobilizar. Fomos pelas aldeias comprar fumeiro para vendermos e, desse modo, conseguimos manter o produto até ao último minuto da feira. Houve momentos em que praticamente já não havia produto.

 

GI - A comunicação social começou logo a dar nota positiva ao evento?

Presidente - Muito pelo contrário. Por exemplo, o conhecido jornal Público, na segunda-feira seguinte, publicou uma página que tinha como titulo "alheiras azedas e presunto rançoso". Foi uma situação que nos deixou inquietos mas convencidos de que estávamos perante uma situação de exagero absoluto por parte do jornalista que aqui tinha estado. Viu no aspeto bolorento que os presuntos têm, que é muito saudável, o adjetivo rançoso e sobre a alheira ouviu algum comentário que lhe serviu para atribuir este título injusto. Depois disto, devo dizer que na segunda edição do certame (1992) já foi a comunicação social quem muito contribui para o sucesso. Agradeço ao meu amigo Rui Dias José, jornalista da rádio Antena 1, acompanhado do entendido crítico de gastronomia, José Quitério. Estiveram com a emissão a partir daqui durante toda a feira. Muito contribuíram para que colocássemos este certame no trilho certo, para o auto reconhecimento de que podíamos continuar e de que o nosso trabalho está correto e estava a ser aceite.

 

GI - É por esse reconhecimento que a Câmara Municipal de Montalegre mantém, ainda hoje, o formato de apresentar este evento no Porto e em Braga?

Presidente - Sem dúvida. Recordo que logo na segunda edição a publicitação aconteceu na Cooperativa Árvore, no Porto. Nesse ano, os jornalistas vieram num autocarro que permaneceu aqui o fim-de-semana. A partir dessa altura mantemos uma relação simpática e produtiva com a comunicação social. Se eles não vêm cá temos que lá ir nós e é isso que vamos continuar a fazer para que passem a mensagem.


GI - Pulamos para outro patamar da Feira do Fumeiro. Sai da Zona Agrária e passa a realizar-se no já extinto pavilhão desportivo (onde atualmente existe, em área superior, o Pavilhão Multiusos). Foi o crescimento da feira que obrigou a Câmara a reenquadrar o certame?

Presidente - Verdade! A feira cresceu sempre mais do que nós projetamos. Foi a afluência do público a puxar por nós. Pelo menos em duas edições decorreu nesse pavilhão e era dividida ao meio. Havia umas escadas para a parte superior onde o público assistia. A partir do quinto ano, passou a ocupar todo o pavilhão desportivo. Entre outras novidades, passamos a ter uma cozinha regional no topo Norte. Aqui reconheço o mérito ao funcionário João Ribeiro - que arquiteta a estrutura todas as edições - que colocou, com a colaboração de todos os funcionários municipais, sempre imagens bonitas e vistosas...

 

GI - Eis que surge a decisão de construir o Parque de Exposições e Feiras de Montalegre. Pelo meio, a Feira do Fumeiro é transferida para a Zona Industrial. Aqui já sentem a romaria do evento...
Presidente - Na verdade, continuava tudo a ser muito pequeno. Foi dessa forma que fomos para a Zona Industrial onde estivemos mais alguns anos. Entretanto, avançamos para a construção do Pavilhão Multiusos onde a Feira do Fumeiro é realizada desde há dez anos. Uma estrutura com toda a dignidade para acolher este e outros eventos. São instalações mais do que suficientes e do agrado de todos.

 

GI - Em 2002 a organização, que até então era exclusiva da Câmara Municipal de Montalegre, passa a integrar a Associação de Produtores de Fumeiro da Terra Fria Barrosã. Porquê esta alteração no modelo organizativo?
Presidente - Decorreu da necessidade de autonomização dos produtores. Era importante que ganhassem consciência de que tudo estava nas suas mãos. Porém, ainda hoje este desígnio não foi conseguido. Ainda sinto esta dependência que não é salutar. Pelo meio, quisemos ainda criar a Confraria do Fumeiro de Barroso que acabou por não se concretizar. É importante que os dirigentes da associação incutam nos seus associados a necessidade de se aperfeiçoarem e modernizarem no fabrico de fumeiro. A Câmara nunca se desvinculará do evento e estaremos cá para apoiar. No entanto, gostávamos de ver uma versão de maior empresarialização dos produtores, em grupo ou individualmente. Há apoios financeiros para isso.

 

GI - Os barrosões têm consciência do que representa a Feira do Fumeiro para o concelho?
Presidente - Penso que sim. Sobretudo os emigrantes. Tenho um feedback extraordinário. Muitos vieram passar o Natal mas já têm viagem marcada para virem à feira. Já é um ritual anual. É simpático ver que credibilizam e dão valor a estas realizações. Os residentes também sabem a extraordinária relevância que tem para o desenvolvimento económico e social da nossa terra. Sentem isso na afluência e nos preparativos. Já se habituaram a ver a nossa feira como uma grande manifestação cultural e económica, estando muito ao nível daquilo que as pessoas ambicionam para a sua terra.

 

GI - Fica surpreendido com os vídeos promocionais da Feira do Fumeiro serem virais nas redes sociais em muito pouco tempo?

Presidente - Não fico nada surpreendido. Todos os anos as redes sociais aguardam que haja uma nova promoção nossa. Também aí está um investimento da Câmara. Não há melhor forma de promover um evento.

 

GI - O certame já superou todos os cenários: chuva, neve, sol, crise...este ano prevê novo sucesso?
Presidente - Absolutamente! Há uma apetência muito grande pelo "cheirinho" que sai de Montalegre para todo o Mundo com reflexo nos visitantes. Este ano, à semelhança de anos anteriores, vão entupir todo o espaço.

 

GI - Este ano a Feira do Fumeiro vai ao encontro de um número mágico: 25. Existe algo de especial no programa do evento?
Presidente - A inovação a cada ano é um dos segredos do êxito da Feira do Fumeiro. Todos os anos renovamos um bocadinho. Este ano temos um programa recheado de novidades interessantes para que estes 25 anos sejam celebrados de forma festiva e exuberante. Temos que manter e consolidar o certame para seguir em direção às "bodas de ouro". Vamos ter excelentes novidades no espaço exterior à feira, na zona destinada à restauração, onde espero que haja muita adesão. No sábado, voltamos a ter entre nós a RTP1 com muita animação. Num espaço exterior de degustação, vão estar três Chefs da culinária nacional. Vamos reeditar o concurso da melhor alheira e da melhor chouriça, com prémios atrativos. É o nosso reconhecimento para com os nossos produtores.

 

GI - Que personalidades irão visitar a Feira do Fumeiro?
Presidente - Estamos a tentar trazer pessoas da área da governação que colaborem connosco na promoção do território e na celebração destes 25 anos. Teremos gente importante do poder político nacional.

 

GI - Quanto vai gastar nesta Feira do Fumeiro?
Presidente - O mesmo do ano anterior. 100 mil euros. Como sabe, estamos há muito tempo em contenção. Acabamos o ano de 2015 com tudo pago. Não houve uma única fatura que ficasse por pagar. Transitamos de ano com um saldo de 550.000 euros. Tudo isto é fruto do espirito de cooperação entre o executivo e os funcionários municipais e, também, da compreensão dos barrosões. O dinheiro da Câmara é de todos nós e tem que ser "espremidinho" para que possa chegar para tudo. Procuramos sempre iluminar o caminho daqueles jovens que tentam ficar na terra e desenvolver uma atividade. O nosso futuro passa pelo setor primário. Temos que desenvolver a agricultura, a pecuária e as florestas. É isto que temos vindo a fazer neste mandato.

 

GI - O que ainda não se disse sobre a Feira do Fumeiro?
Presidente - Penso que não seja preciso dizer muito mais do que o que temos vindo a dizer ao longo dos anos. Mas há uma coisa que deve dizer-se: foi a partir da realização da Feira do Fumeiro e Presunto de Barroso que nos vários municípios do país se desenvolveram iniciativas similares. Isso é uma "medalha" que nós temos para exibir. Queria ainda prestar o meu reconhecimento a todos os produtores e dizer-lhes que foram os grandes obreiros deste monumento que temos para apresentar a todo o país. Quero também prestar a minha homenagem aos agentes económicos, profissionais da hotelaria, que têm estado à altura de dar a imagem positiva que temos passado. De referir que na primeira edição tínhamos apenas uma ou outra pensão. Estamos ufanos e orgulhosos de todas as iniciativas que temos desenvolvido ao longo destes 25 anos, todas coroadas de muito e muito sucesso.

 

Fonte:GI da CMM