O FORNO DO POVO

 
De todas as instituições de vida comunitária, uma das mais importantes, pelo seu significado prático e sociológico, era a construção e manutenção em funcionamento de um forno do povo. Do ponto de vista da vida quotidiana, esta tradição era muito importante no passado, quando as aldeias estavam isoladas. Vivia-se em economia de subsistência e, por isso, havia que ser auto-suficiente no aspecto alimentar. 
As padarias, mesmo na vila, são um fenómeno moderno, e um bom naco de pão não se dispensa à mesa. Tanto mais, que no Barroso abundam os cereais, em especial o centeio, tradicional dos climas frios, que cozido dá um pão muito escuro e saboroso, que se conserva fresco e inalterado durante muitos dias. O forno comunitário servia então para que cada uma das famílias fabricasse regularmente pão, consoante fosse sendo necessário. 
 
Até há poucos anos, ser padeiro não era profissão, pelo que cada um tinha que amassar e cozer o pão que consumia. Assim, o forno era uma obra social e colectiva importante, uma vez que a construção de um forno próprio era incomportável para a maioria das famílias que, deste modo se socorriam, por turnos, do forno colectivo. Além disso, num passado desaparecido, e por isso, por vezes chorado, o forno do povo era um ponto de encontro de toda a aldeia. Aí se albergavam, ao calor da fornalha, os mendigos, os artistas ambulantes e os viandantes, nas noites invernosas. 
Era um "lugar de oração e de reunião, como qualquer capela em serviço permanente" (ANTÓNIO LOURENÇO FONTES, em "Etnografia Transmontana", l, página 10). Era também um local para o serão da rapaziada da aldeia, nas longas e frias noites de inverno, num mundo que já não existe, onde não havia televisão, nem cafés, nem outras modernidades. Melhor ou pior, todas as aldeias tinham o seu forno, havendo até algumas que tinham mais que um. Era o caso de Vilar de Perdizes, que tinha um forno para cada um dos seus bairros. 
 
Ainda hoje, merecem destaque, por estarem em bom estado de funcionamento, além dos de Vilar de Perdizes, os fornos de Padornelos, Tourém e Pitões das Júnias. Estão ainda referenciados outros, em Meixedo, Gralhas, Solveira, Negrões e Travassos da Chã. Nenhum deles tem tido utilização, por serem grandes e consumirem muita lenha até aquecerem e ficarem prontos a usar, o que implica grandes custos, que actualmente não são vantajosos, se comparados com o preço do pão trazido das padarias da vila. Todos os fornos têm de comum serem edifícios baixos, de um só piso, integralmente construídos em granito, para evitar incêndios. São de pedra as paredes, como também o são os arcos e a abóbada que suportam o telhado. 
 
O mesmo se passa com o próprio telhado, formado por lajes graníticas, finamente cortadas. Do lado de fora, ao longo das paredes, existem, em regra, sólidos contrafortes, também graníticos, onde se apoiam os arcos da abóbada interior. Tudo visto, apenas é feita de madeira a única porta que costumam ter. No interior, o espaço é amplo, havendo num dos lados uma bancada de trabalho, de pedra. No outro, fica o forno, propriamente, com a sua cúpula de materiais argilosos e refractários.

Para o viajante que anda em busca das ancestrais tradições e formas de vida comunitária do povo barrosão, de um mundo que já expirou, é obrigatória a visita aos fornos de Padornelos, Tourém ou Pitões das Júnias.